Em 1918 a E.F. Oeste de Minas era a mais importante ferrovia mineira em operação. Sua linha tronco ligava diretamente o porto de Angra dos Reis, no estado do Rio de Janeiro, até a cidade goiana de Goiandira, onde fazia conexão com a E.F. Goiás, numa extensão de 929 quilômetros, cruzando toda a região sudoeste de Minas Gerais. Ela escoava a produção agrícola dessa vasta área até Barra Mansa, onde se entroncava com a E.F. Central do Brasil, permitindo seu transporte até os grandes centros consumidores do Rio de Janeiro e São Paulo. Da mesma forma, as mercadorias importadas tinham seu transporte agilizado, fosse diretamente através do porto de Angra dos Reis, ou a partir do Rio de Janeiro ou Santos através da conexão em Barra Mansa.
Apesar de toda essa importância estragética a Oeste de Minas tinha um sério vício de origem. Sua construção foi feita por um grupo nacional que não dispunha de muitos recursos financeiros, tendo quebrado no início do século XX, tendo o governo federal adquirido seu acervo em hasta pública em 13 de junho de 1903. Essa carência de recursos obrigou à construção de vias permanentes com padrões de qualidade discutíveis para se minimizar o investimento necessário. Por sinal, a bitola inicialmente adotada era de 0,76 m, bastante limitada até para os padrões ferroviários brasileiros. O resultado foi o estabelecimento de traçados muito sinuosos e que procuravam acima de tudo terrenos mais favoráveis, como vales de rios e desvios ao redor de morros, mesmo às custas de um aumento substancial no comprimento do traçado ou níveis de declividade acentuados. Obras de arte como túneis, cortes e aterros eram evitados ao máximo, pois oneravam a construção da ferrovia.
Como se sabe o relevo do estado de Minas Gerais - e, em especial, de sua região meridional - é extremamente acidentado, como a aventura da Ferrovia do Aço nos tornou a lembrar há algumas décadas... No caso da E.F. Oeste de Minas, seu pior trecho era a transposição da Serra da Mantiqueira a partir de Barra Mansa, que fica no vale do Paraíba do Sul. A associação de parcos recursos com uma região particularmente acentuada resultou num trecho francamente indigesto, com curvas de 90 metros de raio e rampas de quase 4% no sentido da importação. O trecho entre Barra Mansa (738 metros de altitude) e o ponto culminante da linha, em Augusto Pestana (1293 m), apresentava portanto um desnível de 555 metros, e num trecho de 30 quilômetros havia um desnível de 738 m. As condições da linha eram tão ruins que as locomotivas a vapor tracionavam uma carga praticamente equivalente a seu próprio peso... Um exemplo citado no livro Estradas de Ferro Eletrificadas do Brasil dá conta que uma locomotiva a vapor Pacific 4-6-2, pesando 82 t em ordem de marcha, podia rebocar 90 toneladas em tempo seco ou 80 toneladas em tempo chuvoso. E note-se que a pluviosidade da região é acentuada...
O alto custo do carvão mineral e a progressiva carestia de lenha, que aumentava de preço a uma taxa de 16% ao ano, começaram a se fazer notar mais acentuadamente a partir da década de 1910 começou a ameaçar seriamente a viabilidade econômica do trecho, pois a quantidade de combustível consumida por tonelada de carga transportada começou a ficar muito exagerada. Ou seja, a motivação principal para o uso da eletrificação na Oeste de Minas era a mesma observada nas demais ferrovias nacionais - ou seja, a substituição do carvão ou lenha, cada vez mais caros - mas o caso aqui estava se tornando crítico demais.
Os estudos da E.F. Oeste de Minas sobre a eletrificação se iniciaram em 1921, ao mesmo tempo em que a Companhia Paulista estava implantando seu primeiro trecho eletrificado. A intenção inicial era não só eletrificar o trecho da Serra da Mantiqueira, como também o trecho na Serra do Mar entre Barra Mansa e Angra dos Reis que, surpreendentemente, apresentava condições mais suaves mas, ainda assim, com rampas de até 2,5%. Os estudos foram concluídos em 1922 mas, como se tratava de uma ferrovia sob jurisdição do governo federal brasileiro, as coisas não podiam ir tão rápido assim...
Apenas em 1925 o governo federal autorizou a abertura de concorrência para a eletrificação do trecho de 73 quilômetros entre Barra Mansa e Augusto Pestana, através do artigo 26 da lei n° 4911, referente ao orçamento da União. Ela foi vencida pela Metropolitan-Vickers, empresa inglesa que iniciou aqui uma carreira bem sucedida na eletrificação de ferrovias nacionais, como a E.F. Central do Brasil, Rede Mineira de Viação e Rede de Viação Paraná-Santa Catarina. O decreto n° 27.235, de 13 de março de 1926 autorizou a celebração do contrato para execução dos serviços, o qual foi assinado em 9 de abril de 1926 pelo eng° Francisco Sá, Ministro da Viação do governo Arthur Bernardes. É interessante notar que essa foi a segunda participação do Eng° Francisco Sá na eletrificação ferroviária brasileira; ele também havia assinado o contrato para a eletrificação da E.F. do Corcovado, em 1909, como Ministro da Viação do presidente Nilo Peçanha.
O abastecimento de energia para o sistema de eletrificação da Oeste de Minas era feito através de usina hidrelétrica própria, uma característica pouco usual nas ferrovias nacionais de primeira linha. Ela foi instalada em Carlos Euler, a 62 quilômetros de Barra Mansa, em plena Serra da Mantiqueira. Sua construção foi muito difícil devido às constantes chuvas que se abatem na região. A usina era abastecida a partir da água contida numa represa feita próximo à cachoeira dos Pilões, no rio Bananal, tributário do rio Preto. A água era conduzida por um canal até outro reservatório numa cota a 213 metros da casa de máquinas. Um aqueduto de 650 metros de extensão conduzia a água até as três turbinas Escher Wyss Pelton de 1.125 HP a 750 rpm. Cada uma dessas turbinas acionava um alternador de 800 KVA, 6,6 kV a 50 ciclos. Esta usina hidrelétrica tinha potência anual de 16.830.720 kWh e capacidade de suportar demanda de 1800 kW por até dez minutos.
Essa corrente era elevada em transformadores trifásicos para 33 kV, sendo essa energia distribuída a circuitos que alimentavam três subestações retificadoras localizadas em Glicério (a aproximadamente 9 quilômetros de Barra Mansa, km 120), Afra (perto de Quatis, km 141) e Carlos Euler (km 169). Essa linha de transmissão de 33 kV, com mais de 45 quilômetros de extensão, era sustentada por postes de madeira. Todas essas subestações geravam corrente contínua através de grupos motor-gerador, cada um deles com potência de 250 kW a 750 V. A voltagem adotada pela E.F. Oeste de Minas foi diferente do padrão nacional: 1500 volts. Dessa forma, dois grupos tinham de ser ligados em série para gerar a voltagem necessária. Cada subestação dispunha de três grupos conversores, gerando 500 kW de potência com dois grupos e mantendo um terceiro de reserva, exceto na unidade de Carlos Euler, que dispunha de cinco grupos, pois gerava 1000 kW de potência com quatro grupos mantendo o quinto de reserva. A catenária para alimentar as locomotivas elétricas era sustentada por postes de aroeira, a exemplo do que já havia sido feito durante a eletrificação da Companhia Paulista de Estradas de Ferro.
O parque de tração elétrico fornecido pela Metropolitan-Vickers para a E.F. Oeste de Minas consistia de cinco locomotivas B+B de 600 HP, quatro motores de 750 volts, 46 t de peso aderente, freio regenerativo e capacidade de tração múltipla por comando eletropneumático. O sistema de freio dinâmico somente podia ser usado se houvesse demanda simultânea de energia na linha, ou seja, se houvesse trens subindo no mesmo trecho de catenária onde outros estivessem descendo. Duas unidades dessa frota foram otimizadas para uso com trens de passageiros de até 122 toneladas, enquanto que as restantes operavam com trens de carga com peso entre 177 e 200 toneladas; a diferença entre elas foi basicamente a relação de redução entre os motores elétricos e os eixos. A prática operacional mostrou que era possível usar duas locomotivas elétricas para rebocar trens com até 300 toneladas com tração dupla no trecho mais difícil, entre a ponte do Rio Preto e Augusto Pestana, que tem 32 quilômetros de extensão e 700 metros de desnível, com rampas de até 4% e curvas com raio de 100 m; locomotivas a vapor podiam rebocar trens de apenas 90 toneladas.
A inauguração oficial do sistema se deu em dezembro de 1928, tendo-se revelado um grande sucesso em função da enorme redução de custos decorrente da substituição do uso da lenha pela eletricidade como fonte energética das locomotivas. Este foi o primeiro trecho ferroviário em bitola métrica a ser eletrificado no Brasil. Os resultados iniciais da eletrificação mostraram que cada kWh medido nas subestações correspondia a um consumo de 4,5 quilos de carvão, o que permitiu uma economia de Cr$ 4.354.195,14 entre 1929 e 1933. Esta quantia correspondeu a 41,70% do investimento feito na eletrificação, excluindo-se os juros, que efetivamente foi totalmente pago em menos de dez anos de operação. Além disso, as máquinas elétricas apresentavam maior facilidade de operação e maior ergonomia aos maquinistas. Seu maior peso aderente assegurava boas condições de tração nos trechos de serra. De fato, sua capacidade de tráfego no trecho elevado foi aumentada para 1760 t/dia no sentido da importação e 2750 t/dia no de exportação.
Apesar de todas essas vantagens as locomotivas a vapor continuaram a ser bastante usadas na Oeste de Minas, operando trens de lastro e operando como manobreiras, pois nem todos os pátios de desvios foram eletrificados. Também aqui houve certa controvérsia sobre os resultados econômicos obtidos, e houve mesmo quem afirmasse que o uso de locomotivas a vapor mais adequadas, como Garrat 2-8-0+0-8-2 ou Mallet 2-8-8-2 poderia evitar a eletrificação...
De toda forma, o desempenho da eletrificação entre Barra Mansa e Augusto Pestana animou a direção da E.F. Oeste de Minas a iniciar os estudos para o prolongamento da eletrificação além da Serra da Mantiqueira em 1929, acabando finalmente com os problemas de tração nesse trecho.
Enquanto isso a situação financeira da E.F. Oeste de Minas e outras ferrovias mineiras se complicava. A crise econômica decorrente do crack de 1929 agravou sua situação financeira, que já não era boa em decorrência de seu péssimo desempenho operacional. Fatores como a multiplicidade de bitolas, traçados sinuosos e pesados e a própria concorrência entre elas alimentavam essa crônica crise, que se traduzia numa degradação contínua dos serviços prestados. A solução encontrada pelo governo do estado de Minas Gerais foi arrendar as ferrovias mineiras controladas pelo governo federal em 1931. Dessa forma, foram reunidas na então formada Rede Mineira de Viação - R.M.V. não só a E.F. Oeste de Minas, como também a E.F. Minas e Rio, E.F. Sapucaí, E.F. Muzambinho e Rede Sul Mineira. O povo logo aproveitaria a oportunidade para encontrar outro significado para a sigla R.M.V.: Ruim Mas Vai...
A primeira providência da administração dessa nova rede ferroviária foi executar obras para melhorar a operação de seus trens. A extensão da eletrificação da antiga E.F. Oeste de Minas teve prioridade: em 1933 conseguiu-se o financiamento para prolongá-la por mais 108 quilômetros entre Augusto Pestana e Andradina (atual Mindurí), autorizado pelo decreto n° 10.734 do governo mineiro, assinado a 3 de março. Desta vez foi a firma alemã Siemens Schuckert Werke que ganhou o contrato para fornecer três subestações, oito locomotivas e todo material elétrico. Foi mantido o mesmo padrão de sistema elétrico adotado pela Oeste de Minas, corrente contínua de 1.500 volts, supridos por três subestações de 800 kW localizadas em Rutilo, Andrelândia e Andradina (Mindurí), respectivamente nos quilômetros 202, 242 e 289 da ferrovia. Essas subestações usavam tecnologia mais moderna do que as anteriormente fornecidas pela Metropolitan-Vickers: a retificação da corrente era feita através de válvulas de vapor de mercúrio, mais confiáveis e de operação mais fácil que os antigos grupos motor-gerador. O fornecimento de energia continuou sendo feito pela usina de Carlos Euler.
As oito locomotivas fornecidas pela Siemens nessa oportunidade tinham sua parte mecânica fabricada pela Schwarzkopf. Elas eram do tipo B+B, com potência de aproximadamente 800 HP em modo contínuo ou 964 HP unihorários e peso aderente de 48 toneladas. Segundo o fabricante esse baixo peso foi possível graças a aplicação de montagem de diversos componentes através de soldagem elétrica, um processo novo na época em que essas máquinas foram feitas. Essas locomotivas foram numeradas de #1200 a #1207. Seus principais dados técnicos podem ser vistos na tabela abaixo:
Ano | Numeração | Rodagem | Potência [HP] | Fabricante | Peso [t] | Comprimento [m] | Diâmetro Rodas Motrizes [mm] | Diâmetro Rodas Guia [mm] | Tração Múltipla |
1934 | 1200-1207 | B-B | 800 | Siemens-Schuckert | 46,4 | 10,860 | 1168 | - | Sim |
A inauguração oficial desse novo trecho deu-se em 12 de setembro de 1936, quando correu o primeiro trem tracionado por locomotiva elétrica direto entre Barra Mansa e Andradina (Mindurí), passando a Rede Mineira de Viação/E.F. Oeste de Minas a ter um total de 181 quilômetros de linhas eletrificadas.
O projeto dessa segunda etapa da eletrificação da antiga E.F. Oeste de Minas incluiu a eletrificação do trecho de Serra do Mar entre Barra Mansa e Angra dos Reis, que também apresentava perfil difícil e que havia sido inaugurado apenas em 1927, já com a ferrovia sob controle do governo federal. As obras de infraestrutura para a eletrificação foram iniciadas em 1933, juntamente com as do trecho entre Augusto Pestana-Andradina (Mindurí), já sob a égide da Rede Mineira de Viação. Estava prevista a construção de duas subestações nesse trecho, em Getulância e Lídice. A incerteza no fluxo de investimentos financeiros tornou a construção desse trecho errático. As obras foram paralisadas logo após seu início e só retomadas em 1938, sendo interrompidas em seguida, provavelmente em função da II Guerra Mundial.
Todos esses problemas na viabilização da eletrificação desse trecho parecem ter impedido uma boa economia nos custos operacionais da Rede Mineira de Viação. Um estudo efetuado pelo eng° Melo Silva, engenheiro-chefe dos Serviços de Eletrificação da Rede Mineira de Viação, publicou um estudo na edição de novembro de 1941 da Revista do Clube de Engenharia que entre 1929 e 1940 essa ferrovia consumiu 50.178.659 kWh, a um custo médio de Cr$ 0,0132/kWh, totalizando Cr$ 662.588,17. A mesma quantidade de energia, se comprada da concessionária publica de eletricidade da época, a Light, teria custado Cr$ 5.719.351,83, ou seja, um custo de Cr$ 0,1139/kWh. Ou seja, a produção própria de eletricidade permitiu uma economia de "apenas" 88,4%, ou Cr$ 5.056.763,66!
As informações do anuário Estradas de
Ferro do Brasil - 1945 dão conta de que neste ano a rede aérea estava totalmente lançada na linha Barra Mansa-Angra, dependendo apenas de suprimento de energia para funcionar; a aquisição dos equipamentos para as subestações estaria sendo feita. Além disso, havia sido decidida a construção de duas hidrelétricas para aumentar a oferta de energia elétrica: a de Oito Arrobas, no rio do Braço, afluente do rio Piraí, que atenderia prioritariamente a linha de Angra dos Reis, e a de Itutinga, que
atenderia à linha entre Barra Mansa e Andradina (Mindurí), além de viabilizar a extensão da eletrificação até Lavras, que já
estava sendo vislumbrada em 1945.
A mesma publicação também cita estudos que estavam sendo feitos sobre uma ligação direta Barra Mansa-Rio de Janeiro por bitola métrica, via Getulândia (no ramal Barra Mansa-Angra dos Reis)-Lages (no ramal de Tairetá, hoje Paracambi)-Belém (Japeri), com tração elétrica. Dessa forma as linhas da então Rede Mineira de Viação teriam acesso direto ao Rio de Janeiro sob condições técnicas mais adequadas que as então existentes. Na época até havia uma ligação direta em bitola métrica das linhas da Rede Mineira de Viação com o Rio de Janeiro, via Barra do Piraí e Linha Auxiliar da E.F. Central do Brasil, mas a conexão entre Rutilo e Barra do Piraí tinha tráfego economicamente inviável na descida da Serra da Mantiqueira, entre Rutilo e Santa Rita da Jacutinga, em função das fortes rampas existentes no trecho que, na época, era servido por locomotivas a vapor. O trecho a ser implantado, entre Getulândia e Belém (Japeri) tinha 78 quilômetros, 46 a menos do que a ligação já existente. Além disso, 32 quilômetros da nova linha já estavam construídos: dez quilômetros no ramal Barra Mansa-Angra dos Reis da R.M.V., catorze do antigo ramal de Passa Três e oito no ramal Belém (Japeri)-Tairetá (Paracambi), onde teria de ser implantado um terceiro trilho, já que ele era de bitola larga. Se o projeto fosse concluído, o trajeto entre Rutilo e Belém passaria a ter 196 quilômetros percorridos por locomotivas elétricas, ao invés de 243 quilômetros percorridos por locomotivas a vapor em condições técnicas precárias. Apesar de todas essas vantagens a idéia não saiu do papel.
Em 1948, após o fim do conflito mundial, a Rede Mineira de Viação retomou o ímpeto de seu processo de eletrificação. A grande ênfase agora eram suas linhas ao redor de Belo Horizonte, onde foi adotado o sistema de corrente contínua de 3000 volts, que tinha se tornado o padrão brasileiro para eletrificação ferroviária. No mesmo ano foram retomadas as obras da eletrificação entre Barra Mansa e Angra dos Reis. Já haviam sido construídos nesse trecho o prédio da subestação de Lídice e iniciadas as obras de uma nova hidrelétrica na cachoeira de Oito Arrobas. Contudo, as obras na região de Belo Horizonte passaram a competir pelos parcos recursos disponíveis, fazendo com que o andamento das obras de eletrificação entre Barra Mansa e Angra dos Reis fosse praticamente nulo, arrastando-se ao longo do início da década de 1950. Nessa época já havia sido decidido abandonar a construção da nova hidrelétrica, estabelecendo-se que o fornecimento da energia elétrica necessária para o trecho passaria a ser feito pela Companhia de Carris, Luz e Força do Rio de Janeiro, a famosa Light.
Em 1951 foi instalado um grupo moto-gerador de 1256 KVA (8.766.000 kWh anuais) em Mindurí para dar conta da demanda da energia elétrica no trecho eletrificado da antiga E.F. Oeste de Minas, já que a capacidade da usina de Carlos Euler não mais era suficiente para dar conta do aumento de tráfego verificado. Os dados compilados pela Rede Mineira de Viação em 1951 e 1952 indicavam que no trecho eletrificado entre Barra Mansa e Mindurí o custo da tração a vapor havia sido de R$ 68,10 e R$ 85,88, respectivamente, contra um custo da tração elétrica de R$ 12,99 e R$ 21,59, respectivamente, o que mostra a grande superioridade das locomotivas elétricas. Nessa época a Rede Mineira de Viação já planejava passar a consumir nesse trecho a energia elétrica proveniente da usina de Itutinga, que havia sido repassada para outra empresa do governo estadual mineiro, as Centrais Elétricas de Minas Gerais - CEMIG.
A conversão do antigo sistema de eletrificação da Oeste de Minas de 1.500 para 3.000 volts havia sido prevista já em 1953, uma vez que ela havia sido recomendada pela Comissão Mista Brasil-Estados Unidos e aprovada pela Presidência da República. Contudo, todas essas providências não foram suficientes para que ela fosse executada imediatamente. Isso comprometeu o desempenho dessa ferrovia, já que o sistema de 1.500 volts era claramente inferior do ponto de vista técnico, apresentando problemas para dar conta do crescente movimento na linha entre
Barra Mansa e Mindurí. Aparentemente as administrações da Rede Mineira de Viação optaram por usar as verbas conseguidas na expansão da eletrificação e em outras obras de melhoria na malha ferroviária. De fato, nesse mesmo ano iniciaram-se estudos para a continuação da eletrificação da linha tronco da antiga E.F. Oeste de Minas, entre Mindurí e Ribeirão Vermelho.
Também em 1953 as ferrovias que constituíam a Rede Mineira de Viação voltariam ao controle do Governo Federal, uma vez que havia sido rescindido o contrato de locação feito com o governo do estado de Minas Gerais.
No início de 1955 a Rede Mineira de Viação ainda tentou viabilizar essa mudança de voltagem no trecho Barra Mansa-Mindurí e retomar as obras da eletrificação entre Barra Mansa e Angra dos Reis pegando uma carona na demanda crescente de transporte decorrente da exportação do minério de Minas Gerais. Nessa ocasião a ferrovia propôs ao Ministério da Viação e Obras Públicas a remodelação do porto de Angra dos Reis e de seu ramal desde essa cidade até Arantina, num plano de emergência para capacitar a exportação de um milhão de toneladas de minério de ferro através dessa rota, minimizando o congestionamento verificado na E.F. Central do Brasil e no porto do Rio de Janeiro. Entre várias outras obras, esse plano incluía diversas obras de eletrificação, a serem executadas em duas etapas. Na primeira seria feita a conclusão da eletrificação entre Angra dos Reis e Barra Mansa, mantendo o sistema original de 1500 volts. Estava prevista a construção de três subestações (duas de 800 kW e outra de 500 kW), 18 quilômetros de linha de transmissão faltantes até as subestações e 12 quilômetros de linha da Light entre Volta Redonda e Barra Mansa para abastecimento das mesmas. Estimava-se que as obras deveriam durar mais cartorze meses. Numa segunda etapa a eletrificação entre Barra Mansa e Arantina seria transformada para operar com 3000 volts, devendo receber novas locomotivas elétricas nesse novo padrão; as treze antigas locomotivas de 1500 volts que operavam aí deveriam ser transferidas para o novo trecho eletrificado entre Angra dos Reis e Barra Mansa. Os equipamentos necessários para essa remodelação incluiriam equipamentos para quatro subestações retificadoras a vapor de mercúrio: Carlos Euler (3000 kW) e Afra, Glicério e Rutilo, cada uma com 1500 kW, e mais sete locomotivas de 1.600 HP e 3000 volts. Essa segunda etapa ainda incluía a construção de uma subestação em Angra dos Reis, mais a construção de uma linha de transmissão de quinze quilômetros entre Jussaral e Angra dos Reis.
Como se sabe hoje, nada disso acabou ocorrendo, e a linha entre Angra dos Reis e Barra Mansa nunca foi eletrificada. As causas desse insucesso parecem ser as mesmas que afetaram diversos sistemas de eletrificação nas ferrovias estatais brasileiras: obras executadas de maneira muito lenta pela carência de recursos e interrompidas pela II Guerra Mundial. O atraso foi tanto que permitiu a chegada das locomotivas diesel-elétricas, abalando a motivação necessária para a eletrificação, pois a economia que ela proporcionaria foi bastante reduzida em função do uso dessas novas máquinas. Também deve ter colaborado para a interrupção definitiva das obras nesse trecho o fato da eletrificação ter sido originalmente concebida no sistema de 1500 volts, já considerado obsoleto na década de 1950. Além disso, as obras civis requeridas no trecho da Serra do Mar eram muito onerosas, pois havia a necessidade de se o alargar diversos túneis. Além disso, haviam nesse local algumas curvas com apenas 69 m de raio, que teriam de ser modificadas para permitir o tráfego de locomotivas elétricas, que requeriam pelo menos 80 m de raio. Apenas o trecho entre Barra Mansa e Lídice ficou pronto, num total de 62 quilômetros, e ironicamente no planalto, onde o perfil da linha era relativamente fácil.
De toda forma, o postergamento e interrupção das obras no ramal de Barra Mansa e Angra dos Reis causa espanto, uma vez que em 1948 a Companhia Siderúrgica Nacional já se encontrava em funcionamento e qualquer melhoramento nesse trecho ajudaria a aliviar bastante a E.F. Central do Brasil, uma vez que pelo menos o carvão destinado a essa usina poderia ser descarregado no porto de Angra dos Reis, seguindo para Volta Redonda via Barra Mansa através das linhas da então Rede de Viação Mineira. Entretanto, por algum motivo, essa motivação não foi suficiente para reverter o quadro... Em 1967 a rede aérea no trecho já havia até sido retirada e a subestação em Lídice, completamente inútil, era guardada por um vigia como um monumento ao desperdício de dinheiro público... já naquele tempo!
Em 1957 a Rede Mineira de Viação foi incorporada à
R.F.F.S.A., culminando o processo de reestruturação do sistema ferroviário nacional, o qual já vinha sendo conduzido através das inúmeras encampações feitas pelo Governo Federal nos anos anteriores.
Somente no final de 1960 entrou em operação a eletrificação entre Mindurí e Ribeirão Vermelho. Esse trecho, pertencente à antiga linha tronco da E.F. Oeste de Minas, usava eletrificação em 3000 volts enquanto que, infelizmente, a seção entre Mindurí e Barra Mansa continuava com o velho padrão de 1500 volts. Ficou, portanto, uma incômoda quebra de tração em Mindurí, impedindo o intercâmbio de locomotivas entre esses dois trechos e um uso mais eficiente dos recursos disponíveis.
Os problemas com o sistema de eletrificação de 1500 volts nas antigas linhas da E.F. Oeste de Minas começaram em seguida, na década de 1960, após várias décadas de operação sem investimentos significativos em sua remodelação e em novas locomotivas elétricas. A sua manutenção começou a ficar complicada, principalmente os grupos motor-gerador das três primeiras subestações inauguradas em 1928. Das treze locomotivas disponíveis anteriormente apenas de quatro a oito estavam em condições de uso em 1960. A situação ficou tão crítica que em 1965 quatro locomotivas Metropolitan-Vickers de 3000 volts fornecidas em 1953 para a Rede Mineira de Viação foram transferidas para o trecho, após terem sido adaptadas para trabalharem com corrente de 1500 volts. Além disso, a crescente adoção das locomotivas diesel-elétricas, especialmente a valente E.M.D. G12, que apresentavam desempenho comparável às elétricas sem depender do uso de catenárias e subestações, inibia maiores investimentos neste sistema. Já em 1967 o trecho Barra Mansa-Arantina era operado de forma quase exclusiva por locomotivas diesel-elétricas. Apenas uma locomotiva elétrica ainda estava operacional, fazendo um serviço ou outro. Em 1968 todas as locomotivas elétricas de 1500 volts que haviam sido adquiridas pela Oeste de Minas foram sucatadas - lamentavelmente, sem que nenhum exemplar fosse preservado. Dessa forma o trecho ficou basicamente sendo operado por locomotivas diesel-elétricas.
O retorno da eletrificação ocorreu em 1971, quando finalmente os equipamentos elétricos foram convertidos para operar sob corrente contínua de 3000 volts, unificando com quase vinte anos de atraso as linhas eletrificadas da antiga Rede Mineira de Viação, denominada agora Viação Férrea Centro-Oeste após sua fusão com a E.F. Goiás e E.F. Bahia-Minas em 1965. A tração elétrica no trecho Barra Mansa-Mindurí tornava-se novamente possível, usando-se as locomotivas Metropolitan-Vickers de 3000 volts adquiridas pela R.M.V. no início da década de 1950.
Esse melhoramento só estendeu a vida desse trecho por mais onze anos. Apesar da penosa crise do petróleo que se arrastou entre 1973 e 1985, exaurindo as divisas do país e causando-lhe uma brutal elevação de sua dívida externa, as linhas eletrificadas da antiga Rede Mineira de Viação começaram a ser desativadas no início de 1982 na região de Belo Horizonte, alcançando o antigo trecho da E.F. Oeste de Minas no final do mesmo ano, sendo substituída pela tração diesel-elétrica que consumia precioso petróleo importado. A rede aérea foi rapidamente desmontada, provavelmente em função do alto valor dos fios feitos de ligas de cobre, restando apenas os prédios abandonados de várias subestações, que ainda hoje marcam esse empreendimento pioneiro nas ferrovias brasileiras.
Dúvidas? Comentários? Críticas?
É só clicar aqui e mandar um E-Mail!
Última Atualização: 18.05.2002
Retornar à Página Principal.
Webmaster: Antonio Augusto Gorni
- Referências Consultadas